Como aprender Latim com dislexia

Renato Pincelli
15 min readNov 8, 2022

Havia estudantes disléxicos na Roma Antiga — e eles também aprenderam Latim

Por Ann Marie Patterson em In Medias Res (Dezembro de 2020).
Tradução de Renato Pincelli.

EU COSTUMAVA OUVIR ISSO O TEMPO TODO: “Latim…, mas você não é disléxica? Tem certeza de que isso não vai ser muito difícil para você?” Ou algo mais desmoralizante: “Sim, também tive aulas de Latim por alguns anos, mas parei porque sou disléxico.”

Alguns traços comuns da dislexia incluem inverter letras, reconhecer algumas palavras como outras palavras, trocar a ordem das palavras de uma frase, enxergar as letras mais próximas do que realmente são e dificuldade em transpor o que ouvimos para o que escrevemos. Tudo isso pode afetar nossa compreensão de leitura e ortografia. Isso não quer dizer que aprender uma língua estrangeira vai ser superdifícil.

Devido à forma como é discutido, o Latim não é apresentado como um assunto favorável às dificuldades de aprendizagem. Poucas disciplinas afugentam tanto os disléxicos como o Latim. Devido à forma como é frequentemente ensinado, poucos leitores disléxicos acabam por atingir os níveis superiores da língua, apesar de cerca de 1 em cada 6 pessoas terem dislexia. Se você é professor, posso quase garantir que tem um aluno disléxico na sua turma, seja ele diagnosticado ou não.

Mas com o enorme aumento na conscientização e interesse em torno das dificuldades de aprendizagem nos últimos cinco anos (especialmente as mais comuns, como dislexia, déficit de atenção e hiperatividade), notei uma mudança de tom entre estudantes e professores de Latim: “sou disléxico, então estou tentando estudar isso de forma diferente” ou “tenho um aluno disléxico, alguma dica de como tornar o estudo mais eficaz para ele?” Sim! Tenho vontade de pular de alegria toda vez que ouço isso.

O simples fato de que mais professores de Latim estão com essa mentalidade é uma grande vitória para a inclusão na sala de aula. As pessoas finalmente parecem entender que um tempo extra no dia da prova é ótimo, mas se você é disléxico, você é disléxico o tempo todo. Você também não precisa parar de ler Latim e buscar um assunto ‘mais fácil’. Você pode apenas precisar abordá-lo de forma diferente.

Photo by Adam Winger on Unsplash

Se não fosse pela paciência do meu professor de Latim do ensino médio comigo e pelo amor à língua, eu provavelmente teria parado de estudar Latim há muito tempo. Ele era um Ph.D. de Estudos Medievais de St. Andrews que ensinava Latim em uma escola para meninas e irradiava alegria. Todo mundo falava sobre como ele era ótimo, e eu estava animada para ter lições de Latim.

Eu já sabia que era disléxica quando entrei em sua turma. Após frequentes reuniões de pais e mestres da escola primária que terminavam em “algo deve estar errado aqui”, fui examinada para dificuldades de aprendizagem no início do Ensino Médio. Eu não achava que a dislexia seria um problema na sala de aula de Latim, já que a maioria dos meus professores anteriores estavam dispostos a ignorar erros ortográficos nos exames e leitura lenta nas aulas, enquanto eu estava disposta a dedicar horas extras para acompanhar o ritmo dos meus colegas.

Infelizmente, os erros ortográficos na classe de Latim acabavam virando verbos mal conjugados e tabelas de declinação problemáticas. A leitura lenta significava uma incapacidade de aprender as palavras do vocabulário a tempo dos exames. Minha estratégia de estudo por força bruta não funcionou no Ensino Médio porque simplesmente não havia horas suficientes em um dia para memorizar tudo. Aquele primeiro semestre foi um trabalho árduo.

Ao mesmo tempo, fiquei tão fascinada com a língua e o acesso que ela me dava a povos e culturas geográfica e temporalmente tão afastados que não pude desistir, especialmente quando começamos a ler a mitologia romana e a Bíblia latina em paralelo. Nada oferece o mesmo nível de escapismo que o Latim. Tal língua tornou-se representativa de dois extremos em minha mente: o tédio excruciante de tabelas gramaticais e de particípios, que me frustravam diariamente e sem fim; e o auge da beleza que encontrei na poesia latina. Um extremo era uma espécie de penitência, o outro uma recompensa. E o primeiro era a porta de entrada para o segundo (eu era uma menina dramática).

Duas coisas me ajudaram a mudar minha atitude e em relação ao Latim e às minhas estratégias para aprendê-lo. Primeiro, o meu professor de Latim lembrou-me que não estamos no mundo para sofrer. A literatura latina não era uma espécie de recompensa pela dor de aprender a língua latina. O processo é que deveria ser divertido e não apenas o resultado final. Depois meu professor de música, um ex-professor universitário e colega disléxico, sugeriu que eu tentasse envolver mais minha memória auditiva enquanto estudava. Isso havia dado certo para ele e ele conseguiu chegar aos altos escalões da academia. Abandonei o extenuante plano de ataque “por prorrogação” e comecei a experimentar diferentes formas de absorver a língua mais facilmente.

Num período de aproximadamente seis anos de tentativa e erro, com diferentes táticas, o Latim ficou muito mais fácil para o meu cérebro disléxico, e eu nunca tive que desistir dele. Acabei me formando em Literatura Latina na graduação e atualmente estou em um programa de doutorado em Estudos Clássicos. Esta não é uma narrativa de trabalho duro e disciplina, que termina com uma recompensa justa. É sobre aprender a contornar o sistema apresentado a você e encontrar um caminho mais fácil.

Para qualquer colega disléxico e aprendiz de Latim por aí, ou professores interessados em ajudar um aluno disléxico, quero compartilhar alguns dos truques de aprendizagem de línguas que foram mais úteis para mim e me ajudaram a passar pelo ensino médio, faculdade, e pós-graduação em Latim.

Devo, porém, incluir esta ressalva: não sou especialista em dificuldades de aprendizagem e não tenho autoridade para diagnosticar ninguém. Falo apenas de minhas experiências de vida e experiências partilhadas com outros estudantes disléxicos. Também vale observar que nem todas as formas de dislexia são iguais. É um espectro, e eu estou na categoria “dislexia moderada com leitura funcional”. Pela minha experiência, o grande unificador entre os disléxicos é que nenhum de nós ganhou um concurso de soletração, mas há uma grande variedade em nossas outras experiências. Esses truques vão ajudar alguns disléxicos mais do que outros.

Dito isso, aqui estão as cinco principais ferramentas que eu descobri a partir de dez anos estudando Latim e de conversas que tive com outros alunos e professores de línguas disléxicos.

Photo by Kenny Eliason on Unsplash

1. Use sua voz e seus ouvidos.

É RARO QUE UM DISLÉXICO seja diagnosticado antes de entrar na escola primária. Isso ocorre porque muitos de nós não temos problemas para aprender a falar, apenas problemas para aprender a ler. Então não temos muitos obstáculos para acessar a linguagem oralmente. Quando aprendemos a nossa língua materna, aprendemos a falar primeiro, depois a ler. Mesmo que sejamos leitores lentos, não ficamos completamente de fora da língua.

Na sala de aula de Latim, isso se inverte. Geralmente aprendemos a ler, depois recitamos o texto à frente da turma (às vezes), depois comunicamos nossos próprios pensamentos (se tivermos muita sorte). Isso apresenta todos os tipos de desafios para nós, porque a nossa memória auditiva é muitas vezes muito melhor do que a nossa memória visual.

Para contornar isso, recomendo fazer o máximo possível de seus estudos em voz alta. Recite em voz alta as desinências que você precisa memorizar. Diga as palavras do seu vocabulário em voz alta. Fale essas partes principais em um aplicativo de gravação e reproduza-as para você mesmo em seu caminho para a escola. Diga qualquer coisa que você precise memorizar em um gravador e ouça mais tarde. Isso ajudará a tirar a língua do papel e a levá-la para um espaço auditivo onde você pode se sentir mais confortável. Além de recitar seu trabalho, ouça o máximo de Latim possível. Há uma infinidade de recursos de escuta latina disponíveis agora, de canais do Youtube como Latinitium a podcasts como Quomodo Dicitur?

Se você tem a opção de se matricular numa turma ativa de Latim ou participar de uma comunidade que fala Latim, melhor ainda. Você vai encontrar um grupo que também tem interesse em se comunicar em Latim, com o efeito adicional de criar um ambiente amigável aos disléxicos.

Photo by Soundtrap on Unsplash

2) Não fique estressado ao ler em voz alta.

ISSO VAI PARECER contraintuitivo depois de eu ter recomendado o uso da sua voz. No entanto, uma característica comum entre os disléxicos é o medo de ler em voz alta… em qualquer idioma. Muitas vezes temos que nos concentrar mais para dar o salto entre as letras da página e os sons que elas devem fazer. Por isso não conseguimos nos concentrar no significado real da frase. Essa ênfase na pronúncia, bem como a ansiedade que às vezes sentimos ao ler devagar ou de modo bagunçado, dificulta a compreensão.

Na escola primária e no ensino médio, ler em voz alta era um pesadelo. Diante de uns 30 colegas meus, eu sofria com uma frase sem reter uma única palavra. Era muito melhor para mim ouvir colegas que podiam ler com clareza enquanto eu acompanhava a página, criando uma ligação mais forte entre o que estava escrito e o som da minha língua.

Tive experiências semelhantes com o Latim. Devido à lacuna de compreensão, é praticamente impossível para mim ler uma frase em voz alta e, em seguida, traduzi-la imediatamente para o Inglês. Eis o que faço, em vez disso, quando estou numa situação em que preciso ler em voz alta: leio a frase em voz alta uma vez, depois leio-a novamente em silêncio, para mim mesma, do início ao fim, bem devagar. A primeira vez é para ouvir o som do Latim. A segunda vez é para a compreensão em si. Neste ponto, posso traduzir, fazer uma paráfrase aliis verbis, contradizer, argumentar com o autor, criticar a gramática, o que for. Se você é um professor que exige a leitura de frases em Latim em voz alta, talvez queira mencionar esse método para sua classe, para que os alunos disléxicos se sintam mais confortáveis com o tempo.

Os resultados, obviamente, podem variar de acordo com a duração e complexidade da frase e do nível de experiência do leitor. Mas permitir-se esse tempo extra e uma segunda passagem te dá a oportunidade de usar sua voz e aumentar sua compreensão.

Se você deseja melhorar a leitura do Latim em voz alta, pode sempre praticar completamente sozinho em um ambiente sem estresse. Também recomendo ouvir gravações do Latim falado diante de você enquanto você acompanha. Em seguida, leia essa mesma passagem em voz alta para si mesmo. O audiolivro Familia Romana, de Hans Ørberg, é excelente para isso, uma vez que existem várias versões gravadas disponíveis on-line.

Photo by Road Trip with Raj on Unsplash

3) Edite, modifique e ajuste seu texto.

UMA QUEIXA DISLÉXICA comum pode ser facilmente remediada: a fonte é muito pequena. Eu poderia lê-la, mas é de tamanho 6 em espaçamento simples, então agora não consigo manter as letras em ordem. Os disléxicos invertem letras e palavras mesmo quando a fonte é algo agradável e familiar, como a Times New Roman de 12 pontos. Fontes pequenas e espaçamento simples agravam isso, assim como fontes diferentes. Letras cursivas e rebuscadas podem ser difíceis até para pessoas sem dislexia e completamente incompreensíveis para aqueles que têm. Em geral, se é o tipo de fonte que ficaria linda em um convite de casamento, eu não gosto de ler.

Mas hoje em dia temos sorte. Os programas de edição de texto facilitam a reestruturação do seu Latim em um formato legível. Boa parte do Latim que você receberá ou deseja ler está disponível gratuitamente online. Eu gosto de copiar e colar o texto no Microsoft Word, colocá-lo em um bom tamanho de fonte grande, colocar espaçamento duplo, e deixá-lo como uma fonte cuja leitura é confortável para mim. Isso ajuda meu cérebro a manter as letras em ordem. Também evito dividir uma palavra hifenizada em duas linhas. A primeira metade de um verbo numa linha com a sua terminação pessoal na linha seguinte e um hífen no meio é um obstáculo desnecessário para os leitores disléxicos. Mas ter controle sobre a formatação de um texto elimina este obstáculo.

[Dica do tradutor: muitos navegadores e programas do Windows oferecem atualmente o modo de leitura avançada, que reduz distrações como propagandas e permite a alteração da fonte e do tamanho de um texto. Em alguns casos, também é possível fazer o computador ler o conteúdo com um sistema de texto-para-voz]

Existem até algumas fontes de código aberto, desenvolvidas especificamente para leitores disléxicos, que podem ser adicionadas ao Microsoft Word. Eu gosto de usar a OpenDyslexic, que é gratuita, mas há outras opções, como a fonte Dyslexie de Christian Boer. Em tais fontes, a espessura das letras ajuda a dar a cada caractere uma forma mais distinta e há mais espaço entre cada letra. Isso ajuda a evitar letras que pulam e viram enquanto você lê.

Se você ensina Latim, encorajo-o a pensar sobre o tamanho da fonte, o espaçamento e o estilo do texto ao aplicar um exame em um aluno. O material facilmente legível não vai prejudicar seus alunos não-disléxicos e pode ajudar imensamente um disléxico. E pelo amor de Deus: por favor, parem de repassar textos que precisam de uma lupa. Estou de olho em vocês, professores de Clássicos.

Photo by Anne Nygård on Unsplash

4) Bloqueie as terminações variáveis com um marcador de página.

NORMALMENTE, OS DISLÉXICOS aprendem a ler usando o reconhecimento completo das palavras. Isso significa que identificamos a palavra mais com base na forma, no contorno da palavra, do que nas letras individuais da palavra. Em latim, a forma da palavra muda drasticamente com as diferentes terminações verbais. Por exemplo, amare e amabantur podem parecer palavras totalmente diferente para um disléxico [essas palavras significam, respectivamente, amar e havia sido amado]. O comprimento da palavra dobrou, há uma letra em forma de gancho [r] no final, onde costumava haver uma boa vogal redonda [e]; e há uma letra alta [b] no meio, onde não havia nenhuma antes. Fica difícil reconhecer o radical quando a forma em geral é tão diferente.

Qualquer uma das letras nesta nova forma de palavra também pode parecer saltar. Amabantur pode parecer amubantar ou ambaantar. É muito difícil identificar aquele ba- imperfeito da 3ª. pessoa do plural; o -nt da voz passiva e o -ur quando as letras não parecem ficar próximas umas das outras.

Eu realmente não sabia como enfrentar esse problema até a faculdade, quando meu professor de Grego Antigo do primeiro ano me mostrou o seguinte truque. Percebi que funciona muito bem com o Latim.

Pego um marcador de página e começo pelo início de uma palavra, encobrindo tudo, exceto a primeira letra, com o marcador. Em seguida, revelo as letras uma por uma, parando onde for preciso e identificando as diferentes partes da palavra. Então, se eu começar com amabantur, nas três primeiras letras eu só vejo ama-. Esta é uma forma que eu reconheço. O ‘b’ não inverte com o segundo ‘a’ e os a’s não pode trocar de lugar com o ‘u’. Neste ponto, essa primeira forma está fixada no lugar e eu movo o marcador para revelar -bant, uma forma que reconheço ao recitar todos esses finais imperfeitos em voz alta para mim mesma. Depois disso, aparece -ur, e posso pronunciar estas duas letras para ouvir seu final passivo.

Se a palavra for muito longa e as suas letras são demasiado agitadas, sempre posso usar o marcador para começar a encobrir uma parte da palavra antes de chegar ao fim, o que impedirá que as letras se movam na outra direção.

Em retrospecto, não acredito que levei quatro anos para descobrir esse truque. É brilhantemente simples e extremamente útil. Você não pode confundir uma letra com outras letras que ainda não estão visíveis. Cobrir metade da palavra para focar na outra metade foi como colocar os óculos de manhã, o que focaliza as coisas em uma espécie de clareza, que deixa tudo mais fácil de se ver.

Sei que assim pode parecer que levo muito tempo para ler uma frase em Latim, mas esse truque é apenas uma ferramenta de treinamento. Eu não preciso fazer isso para cada palavra lida, nem o tempo todo. Depois de um tempo, você não precisa mais fazer isso. Seu cérebro capta as formas que mudam à medida que você lê Latim com mais frequência, e você começa a ler em um ritmo agradável. O marcador ajuda a manter a cabeça no lugar no começo, enquanto você ainda aprende as combinações de letras. Isso pode ser realmente útil quando você precisa escrever um paradigma verbal ou uma tabela de conjugação: escreva o verbo com um pedaço de cada vez e cubra-o à medida que avança, quando necessário.

Eu ainda levo um marcador comigo quando leio Latim e o uso para uma palavra ocasional que não consigo entender. Por exemplo, tenho problemas frequentes em reconhecer proficiscor [verbo que significa “avançar, abrir caminho” e deu origem a proficiente] e suas variantes e combinações. Mas basta juntar um pedaço de cada vez e, em pouco tempo, posso reconhecer a palavra. Eu uso um marcador no papel ou mesmo contra a tela do meu computador. Quando não tenho um marcador, uso apenas a outra página ou o meu dedo.

Photo by Rob Hobson on Unsplash

5) Seja franco sobre sua dislexia.

ESTE SERÁ O PONTO mais difícil para alguns disléxicos. Quando comecei a contar para os professores e colegas que eu era disléxica, ficou claro que as pessoas esperavam essa confissão como um tipo de desculpa. Comecei a me preocupar com o fato de os professores acharem que eu estava apenas inventando desculpas, ou outros estudantes pensando que eu não era assim tão inteligente.

Eu não queria ser vista lendo com meu marcador nem pronunciando a Eneida como uma criança aprendendo a ler o bê-á-bá. Senti que os meus métodos diferentes eram uma espécie de obstáculo e não as adaptações úteis que realmente são. Quando comecei a utilizar mais recursos auditivos e a envolver-me com a comunidade de Latim falado, pedi aos instrutores que reagissem como se eu tivesse dito que eu era uma ET enviada para se infiltrar no Departamento de Clássicos.

Não se deixe abater por isso. Há várias maneiras diferentes de aprender uma língua estrangeira e você não precisa se prender a nenhuma para validar seus esforços.

Na faculdade, eu não queria confessar a nenhum docente que eu era disléxica. Essa foi uma má ideia, porque os professores de línguas tendem a ser mais simpáticos e têm mais vontade de trabalhar comigo do que os outros. Sempre vai haver o maluco ocasional, claro. Mas, na maioria dos casos, esclarecer a situação mudou as coisas para melhor. Com o passar do tempo, as pessoas pararam de ver isso como desculpa. Na minha graduação, foram muito poucos os professores que tiveram reações negativas. No meu programa de pós-graduação, nenhum. Revelar que você é disléxico não é uma desculpa; é uma aceitação da sua realidade, o que te permite prosperar em vez de sofrer em um estado de negação.

Se você é um professor de Latim e também disléxico, é recomendável dizer isso aos seus alunos. Mencione o assunto em uma conversa casual para que seja normalizado. Mostre que isso não o impede de fazer o seu trabalho todos os dias ou de desfrutar do Latim. Também os ajude a ver o que pode ser realizado.

A aceitação do meu professor de Latim e a própria experiência disléxica do meu professor de música levaram-me ao ambiente mental certo para poder ser uma latinista disléxica e feliz. Hoje, quando ensino Latim, falo disso e costumo ouvir de alguns alunos: “Oh, eu também!” O estigma em torno das dificuldades de aprendizagem está perdendo força. Só de permitir que esses alunos saibam que são bem-vindos a participar numa “matéria difícil” pode fazer maravilhas.

Nos últimos 10 anos, aprendi muito Latim e muito sobre a maneira como o aprendi. Eu me considero muito sortuda. Se algumas das coisas não tivessem dado certo no início — se eu tivesse um professor que fosse um pouco menos paciente e atencioso, se nunca me tivessem dito para tentar métodos diferentes, ou se eu não soubesse que eu era disléxica e apenas imaginasse que o Latim era difícil demais para mim — eu teria perdido uma das partes fundamentais da minha vida. Eu teria perdido o que é belo por causa do que é doloroso (ainda sou dramática). Em vez disso, eu só posso aproveitar todos os dias. O Latim ficou mais fácil, mas nunca ficou menos bonito. Para os meus colegas leitores disléxicos de latim: não se apresse, experimente coisas diferentes para ver o que funciona contigo e aproveite a viagem. Só porque você nunca vai ganhar aquele concurso de soletração não quer dizer que você não pode ter um ótimo Latim.

AnnMarie Patterson é estudante de Ph.D. em Estudos Clássicos na Universidade do Sul da Califórnia. Ela adora Latim ativo, arquitetura romana e comida italiana. Patterson publicou esse relato de suas experiências de aprendizado de Latim no “In Media Res” em Dezembro de 2020. Mais recentemente, ela também escreveu sobre como aprendeu grego com dislexia, texto que também pretendemos traduzir.

--

--

Renato Pincelli

Bibliotecário, bibliófilo, jornalista, tradutor e divulgador científico que não tem twitter porque detesta limites de palavras. Não necessariamente nessa ordem.